O nascimento (ou: senta que lá vem história…)
Quem me conhece ou me acompanha pelo facebook sabe como violência obstétrica é algo que me tira do sério, e como eu admiro e defendo partos humanizados. Eu já gostaria de ter parido a Alice na água, sem intervenções, mas por uma série de fatores precisei fazer uma cesárea. Desta vez eu estava animada em tentar um VBAC (parto natural após cesárea).
Minha cicatriz uterina não estava muito espessa, mas o obstetra que me acompanhava topou encarar o desafio. (Em tempo, critérios como espessura da cicatriz uterina não impedem necessariamente que você tente o vbac. Leia este link!) Ele apenas me esclareceu que seria mais seguro para mim e para o bebê que não fosse utilizada analgesia durante o trabalho de parto, pois a dor no local da cicatriz seria um indicativo de perigo, e se eu estivesse sem sensibilidade na região, não seria capaz de oferecer este feedback.
Escuto muitos relatos falando de trabalhos de parto rápidos e intensos, não foi o caso do meu. Passei 3 dias em um “trabalho de parto” cansativo, mas administrável. As contrações eram espaçadas e com uma dor moderada. Eu já estava me achando, crente que tiraria de letra e que se aquilo ali eram contrações, então a mulherada exagerava, pois não doía tanto. Aham Claudia, senta lá…
Até que chegou a madrugada de segunda feira, dia 22. Foi quando o trabalho de parto engatou para valer. Aí sim conheci o que eram contrações de fato. Passei a madrugada inteira cronometrando as contrações e tentando burlar a dor. Eu já não dormia há alguns dias, então estava muito cansada. Minha amiga e obstetra veio cedo na minha casa ver como eu estava, e aproveitou para ver qual era minha dilatação. Eu jurava que já estava com pelo menos 6 cm mas, para meu pânico, estava apenas com 3 cm.
Conforme eu havia planejado, procurei ficar em casa o máximo que pude, e assim o fiz, ficando até as 5 da tarde, quando a dor começou a ficar insuportável. Sim, neste momento eu já estava em 17 horas de trabalho de parto ativo, e jurava que o pequeno estava prestes a chegar. Eu, que sempre fui durona com dor, estava completamente fora da casinha de tanto sofrimento, mal conseguia caminhar e ficar em pé. Além disso o Antônio me chutava muito entre as contrações, de forma que eu não conseguia descansar. Chegando na maternidade fui levada para a sala de triagem onde fui avaliada, e estava ainda com apenas 6 cm de dilatação (eu jurava que estava com o bebê quase coroando).
(Pausa para agradecimento: Não sei nem como agradecer minha querida amiga Juliany, que mais uma vez foi uma presença tão especial no nascimento de um filho. Se a experiência deste parto foi desafiadora e difícil, não consigo nem imaginar em como teria sido sem ela. Não dá nem para listar aqui tudo o que ela fez por mim. Mas eu sei. Ju, tu é demais. Te amo. Gratidão!)
Fiquei mais algumas horas com contrações fortíssimas e infelizmente a dilatação havia parado. Foi quando implorei para o meu obstetra por analgesia pois não aguentava mais. Como eu já estava com 7 cm, ele decidiu me dar, pois o risco de ruptura uterina já era menor. Com isso consegui dormir, me alimentar (estava sentindo tanta dor que não tinha conseguido comer o dia todo) e descansar um pouco. Quando acordei, já estava com dilatação completa e pronta para a etapa expulsiva. Que coisa maravilhosa que foi a analgesia. ❤ ❤ ❤ Eu estava descansada, calma e feliz em começar a fazer força. Pelo ultrassom eu sabia que o Antônio era grande, e que esta seria uma etapa difícil, mas estava preparada para isso.
Eu estava emocionada, e já estava começando a fazer força, quando comecei a sentir uma dor no lado direito do meu corpo. A cada minuto que passava a dor ia ficando maior e mais intensa. Logo descobri o que estava acontecendo: a analgesia havia passado completamente em metade do meu corpo! Ou seja, de um lado fiquei completamente anestesiada e sem movimentos, e do outro fiquei sentindo dores fortíssimas. Isto me desestabilizou muito física e emocionalmente.
As dores foram ficando cada vez maiores, e depois de 5 horas sem muito progresso no expulsivo (o Antônio “emperrou” em um ossinho meu, e parou de descer) eu pedi por aquilo que tanto temia a gravidez inteira: uma nova cesárea. Eu já estava há muito tempo com a bolsa rota, mas confesso que o que mais me motivou foi meu total esgotamento físico e psicológico. Eu só queria que aquilo terminasse.
Então lá fomos de madrugada rapidamente para a sala de cirurgia. Eu precisava ficar imóvel para aplicação de uma nova anestesia, mas a dor era tanta que eu não conseguia ficar parada. Logo em seguida as dores começaram a se amenizar e fui ficando mais calma novamente. Ufa! Estava lúcida e conseguindo ver tudo pelo reflexo do refletor que fica em cima da cama. De repente ouço um comentário do meu obstetra “que estranho, o que era isso?”. A princípio achamos que meu útero estava com uma aderência e a cirurgia continuou normalmente.
O Antônio nasceu e assim como com a Alice fiquei surpresa com o rostinho dele, bem diferente do que eu imaginava! Ele nasceu bem comprido e com o cabelo bem preto, e com um narizinho diferente do meu. Sempre relacionei esta surpresa/estranhamento com a síndrome de Down da Alice, mas acho que num primeiro momento a gente se surpreende com o nosso filho mesmo (bom, pelo menos eu). Mas eu mal pude olhá-lo direito, pegá-lo, amamentá-lo, pois o pediatra imediatamente o tirou da sala e o levou para longe de mim, demorando o que pareceu uma eternidade para retornar.
Se por um lado eu tive a sorte de ser acompanhada por dois obstetras maravilhosos minha gravidez inteira, que me respeitaram e me apoiaram na minha tentativa de VBAC, em contrapartida eu, meu filho e meu marido fomos desrespeitados pelo pediatra de plantão que acompanhou o nascimento. Não pude ver meu filho direito, não pude amamentá-lo, não pude acalmar seu choro. O pediatra realizou diversos procedimentos que eu havia solicitado para que não fossem feitos no meu plano de parto e tratou meu filho sem o mínimo cuidado e carinho. Não quero me alongar muito sobre esse assunto, pois ainda fico triste quando lembro da situação.
Eu estava ainda triste por estar afastada do meu filho, quando meu obstetra veio conversar comigo, ainda na mesa de cirurgia. Ele me explicou que provavelmente devido à minha cesárea anterior, minha bexiga estava posicionada na frente do útero e, ao iniciar a cesárea, ele havia feito acidentalmente um grande corte nela, e que estava tentando entrar em contato com um urologista. Por sorte o marido de uma das médicas que o estava acompanhando era urologista, e foi de madrugada na maternidade para auxiliá-lo na cirurgia de reparação da bexiga.
Passada a cirurgia, ele me informou que tinha corrido tudo bem, mas que eu teria que usar uma sonda urinária por pelo menos uma semana e ficar de repouso. Acho que nesta hora meu nervosismo juntou-se a reação a analgesia e eu comecei a chacoalhar de tanto tremer na mesa de operação. Mas logo me administraram algo (nem sei o que foi), e fui ficando calma novamente.
E este foi o parto do Antônio. Naquela madrugada não consegui dormir direito, pois ainda tinha medo (irracional, eu sei) de uma nova contração. Durante alguns dias fiquei abalada emocionalmente, traumatizada com tudo o que eu tinha passado. Peço desculpas se decepcionei quem esperava um relato fofo e fotos lindas, mas a vida é assim, com bons momentos e outros nem tanto. Mas o que importa é que o Antônio nasceu muito bem eu agora já estou melhor.
Um adendo importante: que este meu relato não desanime quem sonha com um parto normal! Continuo defendendo os partos humanizados, a informação de qualidade e o empoderamento feminino. O meu parto foi difícil, mas existem diversas histórias lindas para vocês se inspirarem.
na imagem: Antônio com um dia de vida 🙂
E o próximo post será sobre o primeiro mês do pequeninho! 🙂